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O que define uma aérea de baixo custo, que o Brasil tanto quer?

Vinícius Casagrande

29/06/2019 04h00

Ryanair é a maior companhia aérea low cost da Europa (Divulgação)

Uma das justificativas do governo para autorizar capital estrangeiro em companhias aéreas e liberar a cobrança de bagagem é a possibilidade de atrair novas empresas para operar no mercado brasileiro, especialmente as chamadas "low cost" (de baixo custo). Essas companhias, teoricamente, oferecem passagens mais baratas em troca de um serviço mais simples.

O presidente Jair Bolsonaro chegou a afirmar que poderia permitir a cobrança de bagagem somente por empresas low cost. Se quisesse levar essa proposta adiante, enfrentaria um dos principais dilemas que rodeiam o mercado de aviação: afinal, o que faz uma companhia aérea ser considerada de baixo custo?

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Definição internacional é muito vaga

Com o aumento do número de empresas chamadas de low cost, a OACI (Organização de Aviação Civil Internacional) tentou criar uma definição mais clara do que são empresas de baixo custo.

Para o OACI, uma low cost é "uma companhia aérea que tem uma estrutura de custo relativamente baixo em comparação com outras companhias similares e oferece tarifas baixas. Essa companhia aérea pode ser independente, uma divisão ou subsidiária de uma grande companhia aérea ou, em alguns casos, uma antiga empresa de fretamento de um grupo de companhias aéreas".

O problema é que essa definição ainda é muito vaga, e há discordância até entre outros órgãos que regulam o transporte aéreo no mundo. A Autoridade de Aviação Civil do Reino Unido, por exemplo, preferiu classificar as companhias aéreas de acordo com o tipo de serviço oferecido. Para ser considerada low cost, precisam ter aviões com uma classe única de cabine, não oferecer serviço de bordo gratuito e não estar conectada a sistemas internacionais de reservas.

Controvérsias sobre quais empresas são low cost

As definições amplas geram controvérsias se uma companhia aérea é ou não é uma empresa low cost. A OACI considera atualmente 118 companhias aéreas ao redor do mundo como empresas low cost. As brasileiras Gol, Latam, Azul e Avianca Brasil (que teve as operações suspensas no final de maio) estão na lista de companhias de baixo custo.

Para a consultoria britânica Skytrax, que organiza o prêmio World Airline Award (considerado o "Oscar" da aviação), entre as brasileiras, apenas a Gol é uma low cost. A Skytrax divulgou no último dia 18 o ranking de melhores companhias aéreas do mundo. Apesar de a Gol ter sido a pior classificada entre as brasileiras, ela foi eleita a melhor low cost do Brasil (era a única brasileira nessa categoria) e a terceira melhor da América do Sul.

Como é uma low cost na prática

Embora não haja uma definição precisa, algumas características estão presentes nas mais famosas companhias aéreas low cost do mundo. Veja abaixo.

1. Frota padronizada

As maiores low cost do mundo operam com uma frota padronizada de aviões. A norte-americana Southwest tem 753 aviões, todos do modelo Boeing 737. Na irlandesa Ryanair, são 430 aviões, também do modelo Boeing 737. Na britânica EasyJet, todos os 164 aviões são da família Airbus A320.

No Brasil, a Gol é a única companhia aérea que adota um modelo de frota única. A empresa conta com 123 aviões Boeing 737.

A opção de padronizar a frota é um dos fatores mais importantes para a redução de custos. Ao utilizar um único modelo de avião, a empresa ganha agilidade na manutenção, e todos os tripulantes e mecânicos podem trabalhar em qualquer aeronave da companhia.

2. Serviço "sem frescura"

Em inglês, o conceito de companhia aérea low cost também é chamado de "discount" (desconto), "low fare" (baixa tarifa) e "budget" (econômica, barata). O termo mais curioso, no entanto, é "no-frill", algo como "sem frescura".

É a definição para as companhias que não oferecem nada além do serviço de transporte do ponto A para o ponto B. Todo o restante é extra – e pago à parte.

Em troca dos preços mais baixos das passagens aéreas, as companhias aéreas cobram por praticamente todos os serviços auxiliares: despacho de bagagem, marcação de assento, serviço de bordo e até pelo check-in presencial no aeroporto.

Além de aumentar a receita, a cobrança por esses serviços também reduz custos. Ao levar menos bagagem, o avião fica mais leve e consome menos combustível. As empresas que cobram pelo check-in presencial podem reduzir o número de funcionários no aeroporto, já que a maioria dos passageiros faz o check-in online.

No Brasil, é cada vez maior a tendência de as companhias aéreas aumentarem a arrecadação com as receitas auxiliares. No ano passado, somente com cobrança de bagagem e marcação de assento, as empresas ganharam R$ 1,02 bilhão.

3. Aeroportos secundários

As companhias aéreas low cost também costumam operar em aeroportos secundários, mais afastados do centro das cidades. Na região metropolitana de Paris, por exemplo, a Ryanair opera no aeroporto de Beauvais. Do aeroporto até a torre Eiffel, são mais de 90 quilômetros de carro e quase duas horas de transporte público. Do aeroporto Charles de Gaulle, o principal de Paris, são cerca de 30 quilômetros de carro e aproximadamente uma hora de transporte público até a torre Eiffel.

Para atrair mais voos, os aeroportos secundários oferecem taxas mais baixas de pouso, decolagem e estacionamento dos aviões. Com pouco movimento, permitem também que os processos de embarque e desembarque sejam mais rápidos e que as companhias aéreas escolham os melhores horários de operação.

Para isso funcionar, no entanto, são necessários locais com ampla infraestrutura aeroportuária. Adotar esse modelo no Brasil é praticamente inviável. A Azul chegou com essa proposta ao escolher como seu aeroporto principal o de Viracopos, em Campinas (SP), distante cerca de 95 quilômetros do centro de São Paulo. Na maioria das capitais brasileiras, no entanto, simplesmente, não existem aeroportos secundários.

Low cost é garantia de preço baixo?

A Ryanair ficou famosa mundialmente por oferecer passagens promocionais por até um euro. Preços como esse, no entanto, são raros. Para especialistas do setor, esse tipo de tarifa é apenas uma ação de marketing.

Ainda assim, as empresas europeias e norte-americanas low cost costumam oferecer preços bem menores que companhias aéreas tradicionais. No entanto, nem toda companhia low cost é sempre uma empresa low fare (baixa tarifa). Como em todas as empresas, as passagens começam a ser vendidas por um determinado preço, que vai subindo de acordo com a procura.

No Brasil, especialistas do setor afirmam que dificilmente uma empresa de baixo custo chegaria com preços muito mais baixos ou equivalentes aos praticados pelas low cost europeias e norte-americanas. As companhias aéreas reclamam que o custo de operação no Brasil é bem mais alto que em outros países. Na Europa, por exemplo, não há imposto sobre o combustível de aviação. No Brasil, os estados cobram entre 12% e 25% de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Somente o combustível é responsável por mais de 30% dos custos das companhias aéreas.

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