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Feita há 95 anos, primeira viagem de avião de Lisboa ao Rio durou 79 dias

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15/06/2017 04h00

Hidroavião Fairey III-D decolou do Rio Tejo, em Lisboa (Foto: Air and Space Museum)

Por Vinícius Casagrande

Hoje, um voo entre Lisboa, em Portugal, e o Rio de Janeiro dura cerca de dez horas. Quando essa mesma rota foi feita pela primeira vez, os portugueses Artur de Sacadura Freire Cabral e Carlos Viegas Gago Coutinho levaram 79 dias e mais de 62 horas de voo para completar a viagem. Eles aterrissaram no Rio de Janeiro no dia 17 de junho de 1922, feito que completa 95 anos no próximo sábado.

A viagem só foi possível depois de os portugueses trocarem, por problemas técnicos, duas vezes a aeronave utilizada na época, um hidroavião modelo Fairey III-D.

Primeiro voo de Santos Dumont inspirou os portugueses

O comandante Sacadura Cabral e o almirante Gago Coutinho se conheceram quando serviram juntos, em 1907, em Moçambique e outras colônias portuguesas na África. Fazia apenas um ano que o brasileiro Alberto Santos Dumont havia realizado, com sucesso, o primeiro voo de avião da história.

Os dois portugueses só foram conhecer o feito de Santos Dumont quando retornaram à Europa em novembro de 1915. A nova máquina de voar despertou interesse imediato em Sacadura Cabral, que, em apenas dois meses, aprendeu a pilotar. A nova paixão lhe rendeu a missão de organizar a Aviação Marítima de Portugal em 1918.

Por outro lado, Gago Coutinho era um notável cartógrafo. No entanto, foi por influência de Sacadura Cabral que realizou seu principal trabalho: a criação da sextante de bolha artificial, instrumento para ser utilizado na navegação aérea ao medir a distância angular entre um astro e a linha do horizonte e permitir calcular com precisão a sua posição.

Juntos, ainda criaram mais um instrumento essencial para a navegação aérea: o corretor de rumos. O equipamento fazia cálculo para compensar os desvios causados pelo vento durante o voo.

Para testar a eficácia dos dois novos instrumentos, Sacadura Cabral e Gago Coutinho realizaram um voo experimental entre Lisboa e a Ilha da Madeira, também em Portugal. O sucesso da viagem fez com que acreditassem que seria possível realizar, pela primeira vez, uma travessia aérea do Atlântico Sul.

Os portugueses Sacadura Cabral (esq.) e Gago Coutinho (dir.) (Foto: Air and Space Museum)

A travessia do Atlântico Sul

Assim, no dia 30 de março de 1922 a bordo do hidroavião Fairey III-D, batizado de Lusitânia, Sacadura Cabral e Gago Coutinho decolaram das águas do Rio Tejo, em Lisboa, com destino à ilha de Las Palmas, já em território espanhol, para a primeira etapa da jornada. O trecho de 1.300 km foi percorrido em 8h37 de voo.

Preocupados com o consumo excessivo de combustível, os portugueses ficaram alguns dias na ilha para reparos no avião. Somente no dia 2 de abril, realizaram um curto voo de teste de menos de 30 km pelo litoral da ilha. Três dias depois, decolaram para a mais uma longa etapa da viagem. Foram 1.500 km e 10h43 até São Vicente, em Cabo Verde.

Os problemas no hidroavião, no entanto, não davam trégua aos portugueses. Na costa africana, o Fairey III-D passou a apresentar problemas de infiltração de água nos flutuadores, o que exigiu novos reparos no hidroavião. Foram 12 dias parados na ilha de São Vicente antes de realizar mais um voo curto até Praia, ainda em Cabo Verde.

No dia seguinte, em 18 de abril, Sacadura Cabral e Gago Coutinho partiram para o trecho mais longo da viagem para, efetivamente, cruzar o oceano Atlântico. Depois de percorrer 1.700 km em 11h21, os portugueses pousavam pela primeira vez em território brasileiro. O ponto de chegada foi o arquipélago de São Pedro e São Paulo.

Com problemas nos flutuadores, um dos aviões afundou no mar (Foto: Air and Space Museum)

Problemas e trocas do hidroavião

No limite do combustível ao chegar ao arquipélago, os portugueses foram obrigados a fazer um pouso mais brusco no mar agitado, que causou a perda de um dos flutuadores do hidroavião. Sacadura Cabral e Gago Coutinho foram resgatados por um navio da marinha portuguesa e levados até o arquipélago de Fernando de Noronha.

Para manter a travessia, o governo de Portugal enviou, a bordo de um dos navios da marinha portuguesa, um novo hidroavião Fairey III-D, batizado de Pátria. A nova decolagem foi feita somente em 11 de maio. Em vez de seguir diretamente à costa brasileira, os portugueses decidiram que deveriam retornar ao ponto no qual a travessia havia sido interrompida.

Ao sobrevoar novamente o arquipélago de São Pedro e São Paulo, o novo hidroavião enfrentou problemas mais uma vez. Desta vez, a pane foi no motor, o que exigiu novamente um pouso forçado. Depois de horas à deriva, os portugueses foram resgatados por um navio britânico e levados novamente para Fernando de Noronha.

O governo português enviou, então, o terceiro hidroavião Fairey III-D, batizado de Santa Cruz. A travessia só foi retomada novamente no dia 5 de junho, desta vez com destino direto a Recife (PE) em uma viagem de pouco mais de 500 km e 4h32 de duração.

Voo entre Lisboa e Rio de Janeiro durou 79 dias (Foto: Air and Space Museum)

Encontro com Santos Dumont e viagem pela costa brasileira

Ao completar a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, Sacadura Cabral e Gago Coutinho tiveram, ainda, um encontro histórico ao desembarcar na capital pernambucana. Eles eram esperados pelo pai da aviação, o brasileiro Santos Dumont.

Após três dias em Recife, os portugueses seguiram viagem pela costa brasileira, passando por Salvador (BA), Porto Seguro (BA) e Vitória (ES). Sacadura Cabral e Gago Coutinho chegaram, finalmente, ao Rio de Janeiro no dia 17 de junho de 1922, após 79 dias de viagem e 62h26 de voo.

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